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No Expresso Político de hoje vamos falar sobre empresários e setores religiosos que denunciam ofensiva judicial. Este artigo analisa o discurso de perseguição e seus impactos no campo conservador.
Em 18 de fevereiro de 2025, a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou uma denúncia formal ao Supremo Tribunal Federal (STF), acusando o expresidente de liderar uma organização criminosa, tentar golpe de Estado, e ameaçar a democracia peruana — ações que pedem até 28 anos de prisão .
Nas horas seguintes ao anúncio, líderes evangélicos, canais digitais conservadores e figuras públicas religiosas reagiram imediatamente, sustentando que a ação configura uma perseguição política disfarçada de procedimento jurídico. Termos como “guerra contra a fé” e “caça às bruxas” ganharam destaque nos discursos vinculados ao segmento .
O objetivo deste artigo é analisar essa narrativa de perseguição construída pelo campo evangélico, avaliando como ela molda a mobilização política, influencia a opinião pública conservadora e reflete tensões institucionais no Brasil democrático.
A investigação em pauta ⚖️
A denúncia da PGR ao STF, apresentada em 18 de fevereiro de 2025, especifica que o expresidente é acusado de:
Liderar organização criminosa armada, responsável por planejar um golpe de Estado e ações violentas contra instituições democráticas .
Tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, utilizando violência ou ameaça .
Incluir dano qualificado a patrimônio público e tombado, além de “grave ameaça” a membros do Supremo e do Legislativo, derivado dos ataques de janeiro de 2023 .
A peça da PGR, com cerca de 270 páginas, é respaldada por laudos, interceptações telefônicas e depoimentos da Polícia Federal, que indiciaram mais de 34 pessoas, incluindo figuras militares e civis .
Essa ação judicial é relacionada à Operação Lesa Pátria e à Operação Contragolpe, que investigaram os atos antidemocráticos ocorridos após as eleições de 2022 e em 8 de janeiro de 2023 . O novo inquérito reúne investigações anteriores, especialmente aquelas que visam comprovar estruturação da tentativa de golpe, envolvimento de militares, e planejamento de violência contra autoridades democráticas .
Escopo e fases do processo investigativo:
Relatórios da PF — identificação de núcleos internos de conspiradores (militares, assessores, políticos) .
Denúncia da PGR — formalização encaminhada ao STF com pedido de 28 anos de prisão para o líder principal .
Decisão do STF — relatores (como Alexandre de Moraes) deverão avaliar a admissibilidade da ação e aceitar o caso em plenário ou turma .
Fase de instrução — possível abertura de ação penal no STF com produção de provas, oitivas de testemunhas e debates jurídicos, previsto para seguir até o segundo semestre de 2025 .
A denúncia concentra-se em uma trama golpista com violência, organização criminosa e planejamento intencional para abalar instituições democráticas. O processo envolve diversas fases — da investigação ao julgamento — e representa o desdobramento de operações que tentam enquadrar o expresidente e seus aliados num histórico de ataque ao Estado de Direito.
Reação do campo evangélico ✊
📣 Comunicados e notas de instituições religiosas
Após a denúncia da PGR, várias entidades evangélicas (como conselhos de ministros e convenções de igrejas) emitiram notas classificando a investigação como perseguição judicial. As comunicações reforçam que o alvo seria “um cristão que defende valores tradicionais”, interpretando o processo como ataque sistemático contra a expressão religiosa e conservadora .
🎙️ Influência de canais e influenciadores digitais
Canais digitais como “Dois Dedos de Teologia” e grandes pastores em rádio e redes sociais reforçaram a narrativa. Nas lives e vídeos, o termo “guerra contra a fé” foi repetido, incentivando os fiéis a ver o processo como ato de perseguição ideológica. Essa abordagem gerou elevado engajamento, com mobilizações online para defesa do ex-presidente .
🌍 Comparações com episódios internacionais
Nas redes, o caso legal foi equiparado a situações enfrentadas em países da América Central, especialmente Nicarágua, onde igrejas enfrentam sanções estatais, e também comparado à “cristofobia” percebida na Europa e nos EUA. Essa analogia reforça a narrativa de que se trata de um “episódio global” contra cristãos conservadores, consolidando apoio emocional e político entre os seguidores .
A reação evangélica à denúncia contra o ex-presidente foi rápida e articulada, combinando frentes institucionais, mídia digital e narrativas internacionais. O resultado é uma mobilização política motivada por comoção religiosa, que ultrapassa as fronteiras do caso jurídico, polarizando ainda mais o cenário conservador.
Narrativa de perseguição 🎭
🔥 Termos usados pelos evangélicos
No rastro da denúncia, surgiram discursos carregados de emoção nos meios evangélicos. Expressões como “guerra contra a fé” foram amplamente repetidas, enquanto transmissões religiosas comparavam o processo a um “inferno jurídico” — termo cunhado por líderes que afirmam que a justiça estaria “queimando” o ex-presidente. Em uma das live, uma bispa chegou a afirmar ter tido uma visão de o expresidente “sendo levado ao inferno” legalmente .
📢 Retórica de injustiça e ataque identitário
O discurso construído é claramente mobilizador, argumentando que não se trata apenas de um processo judicial, mas de perseguição ideológica: evangélicos enxergam o expresidente como representante dos valores cristãos, o que justificaria a acusação como guerra sistemática contra os fiéis conservadores. Isso fortaleceu a narrativa de que a democracia estaria sendo atacada por meio da criminalização da fé — e não de condutas criminosas.
📲 Impacto nas bases digitais
A repercussão foi rápida e expressiva nas redes sociais evangélicas. Dezenas de vídeos com hashtags como “#PerseguiçãoReligiosa” e “#InfernoJurídico” se tornaram virais, mobilizando apoiadores a compartilhar, comentar e organizar ações de apoio — como orações coletivas e abaixo-assinados. Essa tensão emocional, intensificada por lideranças conhecidas, gerou picos de engajamento e reforçou a ideia de que o campo conservador sofreria uma ofensiva institucional.
A narrativa de perseguição criada após a denúncia é construída a partir de uma retórica de guerra espiritual, injustiça institucional e identidade religiosa ameaçada. A adeptos, o processo não representa apenas uma investigação jurídica, mas um ataque ao que consideram ser a sua fé — impulsionando uma mobilização política e cultural intensa e polarizada.
Implicações políticas 🏛️
🪧 Mobilização de apoiadores e atos públicos
A narrativa de perseguição rapidamente transbordou das redes sociais para as ruas. Igrejas e grupos religiosos organizaram vigílias e manifestações públicas em apoio ao ex-presidente. Cartazes com frases como “a fé não será calada” e “não toquem no ungido” foram vistos em atos promovidos em frente a fóruns e parlamentos estaduais, mostrando a força da articulação religiosa conservadora na mobilização de massa.
Além disso, lideranças e parlamentares ligados ao campo evangélico utilizaram púlpitos e sessões solenes para denunciar o que chamaram de “caça às bruxas jurídica”, exigindo respeito à liberdade religiosa e à escolha democrática feita nas urnas em 2018.
📊 Impacto sobre o apoio à candidatura futura
Embora juridicamente o cenário ainda seja incerto, a mobilização reforçou o capital político do ex-presidente entre os evangélicos, consolidando sua imagem de “perseguido” e mártir da direita cristã. Pesquisas recentes já apontam que, mesmo diante de investigações, uma parcela significativa desse eleitorado manteria o apoio em uma eventual nova candidatura — considerando-a não apenas uma opção política, mas uma missão espiritual.
Esse efeito tende a dificultar a ascensão de alternativas no campo conservador, já que qualquer novo nome teria que disputar espaço com um símbolo vivo de resistência ideológica.
📺 Ajustes na estratégia de mídia conservadora
Canais religiosos e perfis de opinião do campo conservador intensificaram o uso de conteúdos emotivos, com foco na perseguição religiosa e no discurso de injustiça. Houve também uma mudança tática: menor foco em explicações técnicas e maior ênfase em elementos simbólicos — oração, batalha espiritual, “Deus está no controle”.
Essas mídias também passaram a trabalhar com narrativas pré-defensivas: antecipando possíveis desdobramentos jurídicos, já posicionam qualquer resultado negativo como prova de um sistema corrompido contra os cristãos.
⚠️ Fé instrumentalizada para justificar impunidade
Críticos apontam que enquadrar a denúncia como uma ofensiva religiosa dilui o peso das acusações e protege figuras públicas. Esse uso político da fé como escudo ameaça a credibilidade do campo conservador, reduzindo a atuação religiosa ao apoio automático a culpados — em vez de permitir reflexão ética e contestação honesta. Estudos mostram como esse tipo de narrativa pode promover uma lógica de “lealdade incondicional” em vez de accountability.^
❗ Distinguir crítica institucional de negação legal
Outro ponto sensível é a separação entre influência crítica legítima e negação do processo legal. Há um risco evidente de que posições políticas se convertam em deslegitimação de instituições, quando qualquer questionamento jurídico é respondido como ataque à fé — em vez de debate jurídico. Essa linha tênue exige clareza: é possível defender pessoas ou valores sem recorrer à insatisfação política para justificar recusa na aplicação da lei.
Repercussões institucionais e democráticas 🏛️
🏛️ Pressão sobre órgãos de controle e Judiciário
A narrativa de perseguição religiosa coloca em xeque a atuação independente de órgãos como STF, MPF e PF. Quando investigados são rotulados como combatentes de fé, isso fragiliza a imparcialidade do sistema legal. Dessa forma, decisões jurídicas — inclusive denúncias — passam a ser vistas não como medidas legais, mas como parte de uma guerra ideológica, prejudicando a confiança institucional.
✝️ Tensão com o Estado laico
Ao conjugar poder estatal e discurso religioso, cria-se um ambiente que ameaça o princípio da separação entre Igreja e Estado. Quando segmentos religiosos rotulam processos judiciais legítimos como perseguição à fé, estabelece-se um precedente perigoso: todas as ações contra figuras religiosas podem ser rotuladas como ataques religiosos, em vez de interferências no Estado cristão, o que distancia o Brasil de um ambiente institucional plural .
⚖️ Potencial de erosão da confiança no sistema legal
O discurso de “justiça injusta” conduz a uma narrativa em que vencer no tribunal é secundário diante da vitória simbólica. Isso fomenta o descrédito público, com apoio à ideia de que as instituições favorecem fake news ou perseguição de determinados grupos. À medida que cresce esse discurso, diminui a adesão à ideia de que o sistema legal pode julgar qualquer cidadão de forma igualitária — erosão que ameaça a democracia participativa.
✔️ Síntese
A acusação de perseguição contra o expresidente mobilizou tensões profundas no campo democrático: ela abalou a autonomia do Judiciário, provocou crise institucional quanto ao princípio laico, e reduziu a credibilidade no sistema legal. Esse cenário pode gerar danos duradouros à saúde democrática do país — especialmente se políticos e religiosos continuarem a se beneficiar da relativização das regras democráticas.
Conclusão
A denúncia formal contra o ex-presidente representou mais do que um capítulo jurídico: ela desencadeou uma reação intensa do campo religioso, em especial de segmentos evangélicos, que rapidamente enquadraram o episódio como mais um sinal de “perseguição à fé cristã”. Essa narrativa encontrou eco entre influenciadores religiosos, lideranças parlamentares e fiéis engajados, ampliando o alcance político e emocional da pauta.
Ao longo do artigo, examinamos como o uso estratégico do “complexo de perseguição” pode mobilizar massas, tensionar instituições e fragilizar os pilares do Estado laico. A retórica de combate ideológico, quando aplicada a processos judiciais legítimos, transforma a justiça em palco simbólico, substituindo a objetividade legal pela polarização moral. Isso não apenas distorce o papel do Judiciário, mas também compromete a confiança do cidadão no sistema democrático como um todo.
Nesse cenário, é urgente reafirmar o valor da responsabilidade institucional — tanto de quem julga quanto de quem comunica. O Brasil precisa de um ambiente em que a fé seja respeitada, mas que os instrumentos do Estado funcionem sem pressões externas ou distorções discursivas.
A sociedade civil, jornalistas, lideranças religiosas e os próprios eleitores devem se comprometer com a transparência, a vigilância ativa e o fortalecimento do Estado de Direito. A democracia não pode ser refém de discursos de fé quando usados para blindar indivíduos da lei. O desafio do presente é garantir que a crença não se torne escudo contra a justiça, mas ponte para a convivência plural e o respeito mútuo.




